MINHA MÃE
Familiares, amigos, vizinhos - todos diziam que a minha MÃE era "uma ótima pessoa". Sim, ela era também silenciosa, carregada da dor por perdas precoces dos pais e irmãos. Falava baixinho. Dificilmente víamos o brilho dos seus olhos sob os óculos pesados pelas lentes grossas e a armação larga. Tudo na família passava por ela, desde a compra de sabonete até os recebimentos de dinheiro e os pagamentos das mais diversas contas e dívidas da família. Emocionalmente era um saco de pancadas. Se um filho se indispunha com outro ou com o vizinho, era sobre seus ombros que recaía a responsabilidade e as consequências. Se o papai ou alguém sentia uma dorzinha, ela era a primeira a ser acionada, e a que providenciava medicamento, curativo, conforto.
Os filhos imaginavam que ela era imortal e que nunca iria lhes faltar panelas cheias de comida boa sobre o fogão, roupas assentadas no corpo, remédios, orações, proteção, conselhos e até reprimendas por algum deslize.
Quando chegava a hora do banho, o papai se dirigia ao banheiro, onde o aguardava um kit completo, arrumado com esmero nos mesmos lugares: cueca, pijama, chinelo, sabonete e toalha.
Em alguns momentos ela sorria na presença dos quatro primeiros netos. Fazia comidinha gostosa, costurava e consertava suas roupinhas. Aconselhava. Ensinava a primogênita a fazer palavras cruzadas. Às vezes cantava baixinho: " Que beijinho doce que ele tem, foi ele quem trouxe de longe pra mim. Um abraço apertado, um suspiro dobrado e amor sem fim. Que beijinho doce que ele tem. Depois que beijei ele nunca mais amei ninguém..."
Gostava de flores, cuidava do jardim na frente da casa, onde havia uma Dama da Noite, que perfumava o quarteirão inteiro.
Ela era tudo para todos, exceto para ela mesma. O coração enfraquecido só recebia os cuidados do peruano, Dr. Juan, quando ela aceitava ir visitá-lo. O médico via nela um pouco de sua própria mãe. Havia uma ótima empatia entre ambos, mas mesmo assim ela não gostava de se consultar. Tomava remédios fortes para controlar a pressão. Aqueles que a deixavam sonolenta, desprezava.
Até que um dia resolveu se libertar dos medicamentos. Aposentou todos. Dizia que estava se sentindo bem melhor sem eles. Repentinamente, foi chamada por Deus para descansar na eternidade.