RAPOSA
Era uma vez...
1... uma Raposa que, muito faminta, viu alguns cachos de uvas negras e maduras, penduradas nas grades de uma viçosa videira.
Quis pegá-los, usando todos os recursos de que dispunha, sem sucesso. Cansada, deu meia volta e, consolando a si mesma, foi embora, dizendo:
- Estão verdes!
Moral da história:
O homem, às vezes, culpa as circunstâncias pelo seu fracasso. Não aceita que incapaz é ele mesmo.
(Autor: Esopo)
2...um Leão e um Urso, que estavam caçando juntos, capturaram um Cervo. Depois de uma luta feroz entre ambos pela posse da presa, caíram no chão, cansados e feridos.
A Raposa, que observava tudo a uma distância segura, vendo-os caídos, e o Cervo abandonado entre eles, aproximou-se sorrateira, agarrou-o e desapareceu no mato.
Ao perceber a perda da caça, o Leão e o Urso ainda nocauteados disseram:
- Ai de nós, que nos ferimos um ao outro apenas para garantir o jantar da Raposa!
Moral da história:
Algumas vezes acontece de alguém fazer todo trabalho pesado, e outro levar todo o lucro.
(Autor: Esopo)
3...um Lenhador, que tinha um filho de poucos meses e uma raposa, sua amiga, tratada como bicho de estimação e de sua total confiança.
O Lenhador ia trabalhar de manhã até a noite, deixando seu filho aos cuidados da raposa. Todas as noites, ao retornar do trabalho, a raposa ficava feliz com sua chegada, apesar de seus vizinhos estarem sempre alertando para os perigos de deixar um animal selvagem cuidando de uma criança. Diziam que quando a Raposa sentisse fome comeria o bebê. O Lenhador sempre retrucava, alegando que isso era uma grande bobagem. Os vizinhos insistiam:
- Lenhador, abra os olhos! A Raposa vai acabar comendo seu filho. Quando sentir fome, comerá seu filho...
Certo dia, ao chegar a casa, o Lenhador- muito exausto do trabalho e muito cansado de ouvir esses comentários – deparou-se com a Raposa sorrindo como sempre, mas com a boca totalmente ensangüentada. O Lenhador suou frio e, sem pensar duas vezes, acertou o machado na cabeça da raposa. Ao entrar no quarto desesperado, encontrou seu filho no berço dormindo tranqüilamente e, ao lado do berço, uma enorme cobra morta.
Inconsolável, o Lenhador enterrou o machado e a raposa juntos.
Moral da história:
Se você confia em alguém, não importa o que os outros pensem a respeito. Não se deixe influenciar, mas, principalmente, nunca tome decisões precipitadas.
(Autor Desconhecido)
Nas três histórias são apontadas três características aparentemente incompatíveis atribuídas à raposa: despeitada, esperta, mãe cuidadosa.
Por que esse animal é tão usado para representar comportamentos típicos dos humanos?
- Talvez pela freqüência com que é encontrada nos mais variados pontos da Terra, talvez pela versatilidade com que vive e se alimenta.
As raposas são mamíferos carnívoras da família dos canídeos, sendo a maioria pertencente ao gênero Vulpes. No entanto, não se pode generalizar. As raposas sul-americanas, por exemplo, não são vulpes, por não serem classificadas como raposas, e sim como canídeos, gênero ao qual pertencem os lobos. Por terem sido consideradas "falsas raposas", receberam a denominação de Pseudalopex (pseud=falso alopex=raposa).
De um modo geral, raposa é o carnívoro selvagem com maior distribuição e abundância do mundo. Tem um focinho esguio, arrematado por orelhas longas e pontiagudas, e cauda espessa e vistosa com cerca de 50 cm de comprimento. A pelagem é castanho-avermelhada, e as patas são dotadas de garras não retráteis. O corpo e a cabeça apresentam um comprimento que pode variar entre 60 a 90 cm, e um peso entre 5 a 10 kg. Vive em grupos, formados por um macho adulto e várias fêmeas. As fêmeas são bem menores que os machos.
A gestação dura em torno de dois meses após o acasalamento, produzindo uma ninhada de quatro a cinco crias por ano. Mora em tocas escavadas e protegidas pela vegetação, por ela construídas ou herdadas dos coelhos. Vive um máximo de nove anos.
Normalmente é um animal de atividade essencialmente noturna e dieta quase exclusivamente carnívora. Alimenta-se de pequenos mamíferos - coelhos, lebres, ouriços, aves, peixes, insetos. Come também frutos silvestres e cultivados. Vai atrás de lixeiras urbanas, quando lhe falta alimento no campo. Armazena o que caça e não conseguiu comer no mesmo dia, escondendo o alimento para o consumo futuro. Chega a ter até vinte esconderijos de comida, conseguindo lembrar-se de todos eles. Nas zonas rurais, costuma assaltar galinheiros e mata mais galinhas do que necessita, constituindo-se em inimiga ferrenha dos criadores.
De caçadora, sua caça acabou virando esporte tradicional na Inglaterra e na Escócia. No entanto, em 2005, foi proibida pelo Parlamento Britânico, visto que violava os direitos dos animais propostos pela UNESCO. Na Escócia também já havia sido proibida alguns anos antes. Mesmo em desacordo com os direitos dos animais, muitas raposas e fenecos estão sendo vendidos na Rússia e nos Estados Unidos da América como bichos de estimação. Fenecos são as chamadas raposas-do-deserto, que habitam regiões desertícas, semidesérticas e montanhosas do Norte da África e da Península Arábica. Pode-se mencionar ainda a raposa-das-estepes, que vive na Mongólia e na Ásia Central e Oriental, a raposa-do-Cabo, que é encontrada na África do Sul, do Zimbábue a Angola e vive sozinha ou em pares nas savanas abertas e nas regiões semiáricas. Ainda poderíamos enumerar muitas outras espécies, que são batizadas de acordo com a região em que aparecem com maior freqüência. Geralmente variam quanto à cor do pelo e da cauda, comprimento, hábitos de sobrevivência.
Vale a pena conhecer um pouco sobre a raposa-das-falkland ou warrah, extinta desde o século XIX. Era o único mamífero endêmico das Ilhas Falklands (Malvinas) e foi a única espécie de canídeo que desapareceu nos tempos modernos. A espécie foi descrita pela primeira vez em 1690 e consta das notas de Charles Darwin que visitou o arquipélago em 1883 e previu a sua extinção.
Face à inexistência de roedores nas ilhas, supõe-se que sua alimentação fosse à base das aves marinhas,crustáceos e crias de leões marinhos. A raposa-das-falkland vivia em bandos e tinha um comportamento bastante dócil para com os homens que visitavam as ilhas.
Sua extinção deve-se unicamente à intervenção do homem. O animal começou a ser perseguido noséculo XVIII, sobretudo por causa da pele. Em 1839, um número considerável de exemplares foi abatido durante uma expedição de caçadores dos Estados Unidos, em busca das peles valiosas destes animais. Após este evento, a população de raposas ficou bastante fragilizada. Em 1860, colonos escoceses introduziram a criação de ovelhas nas Falkland. Para eliminar o que consideravam uma ameaça aos seus animais, os colonos organizaram uma campanha de envenenamento das raposas, tornando a espécie rara. O processo de extermínio continuou e a última raposa-das-falkland morreu em 1876.
Lamentavelmente, restam apenas onze desses animais empalhados e distribuídos por vários museus.
Finalmente, vamos conhecer um pouco mais sobre a raposa brasileira, também denominada raposa-do-campo. Ela habita os campos e cerrados de Mato Grosso, giás, Minas Gerais e São Paulo. Parecida com o cachorro-do-mato, é o menor dos canídeos brasileiros, medindo até um metro de comprimento e pesando cerca de três quilos. A cor de sua pele é cinzento-escura, com a barriga amarelada e a ponta da cauda negra. Vive sozinha. Elegante, tem um caminhar parecido com a de modelos da alta costura na passarela, embora troque tudo isso pela oportunidade de abocanhar o que aparece pelo caminho. Assim como a onça e o lobo, também é especialista em caçar à noite, preferindo surpreender a presa na escuridão. É um animal muito atento e percebe tudo o que ocorre ao seu redor. A visão, a audição e o olfato são bastante desenvolvidos. Pode-se afirmar que, pelas características apresentadas, situa-se entre o cão e o lobo.
Infelizmente, dentre os problemas provocados pelo desmatamento no Cerrado está o comprometimento da sobrevivência de milhares de espécies, inclusive a da raposa-do-campo, que possui hábitos e habitat bem conhecidos.
Este texto foi extraído do meu livro "Animais que Plantam Gente"