Minha vida em Brasília. Episódio 7:
Agora eu estava com um emprego de carteira assinada, renda superior a dois salários mínimos. Aluguei um quarto em casa de família na SQS 416. O apartamento era pequeno para o casal com duas crianças. Mesmo assim, eles precisavam daquele aluguel para complementar a renda. Avisei à família e meus pais, em grande dificuldades, mandaram o meu irmão de 16 anos vir morar e trabalhar em Brasília. Meu namorado, que era Chefe de Pessoal daquela Construtora, de onde eu me demiti, arrumou uma colocação lá para o mano. Comíamos em uma cantina na Quadra. O PF era muito ruim, mas era o que havia. Mamãe mandava pães, biscoitos, doces, roupas sempre que podia. Algum tempo depois eu apareci com anemia. Foi difícil tratá-la.
Depois da posse solene, fui designada para trabalhar no turno da manhã. O local - Acampamento da Marinha - fica 6 km à esquerda do KM Zero do DF (Saída Sul). Para chegar lá às 8h, eu pegava um TCB- Gama, via Marinha, às 6h, no ponto de ônibus sem cobertura na lateral da pista em direção à saída sul, via zoológico. Se era longe e difícil ir, mais difícil era voltar para casa depois de quatro horas de aula. Nossa realidade era dura. Assim que batia o sinal de encerramento das aulas, passava um ônibus sempre vindo do Gama. Aquela já não nos servia por dois motivos: deveríamos sair correndo e muitas vezes não cabia mais ninguém. No acampamento não havia sequer um boteco, onde pudéssemos comprar qualquer coisa para comer. A Marinha oferecia à Escola refeições dos soldados. A comida era horrível. Dizíamos que se jogasse o bife na parede, ele voltaria na nossa cara. Os grãos de feijão nadavam em uma água preta ora sem sabor, ora muito salgada. O arroz era misto (com casca e sem casca). Ficava difícil engolir aquilo. Nós, professoras, esperávamos pelo ônibus das 13 horas. Às vezes vinha tão cheio, que não conseguíamos entrar. Então íamos a pé pela trilha no meio do mato até a BR, onde pegávamos carona nos caminhões. Ficamos amigas de muitos caminhoneiros, que nos tratavam com o maior respeito. Era bonito de se ver a gentileza e a atenção que eles nos dispensavam.
Voltando ao meu novo trabalho, quando me apresentei na Escola, a Diretora encaminhou-me para a sala dos "encapetados". Ninguém queria dar aulas para aquela turma. Subiam nas carteiras, faziam guerra de papel mastigado, gritavam e não obedeciam aos comandos. Era um 3º ano de crianças grandes, a maioria repetente, vindos do Gama e arredores. Fiquei apavorada! Com pulso firme - não sei como - fui controlando a situação. Naquela época professora podia colocar os rebeldes em pé no canto da sala de cara para a parede, tirar-lhes o horário do recreio e mandá-los escrever no caderno 100 vezes: "Devo obedecer à minha professora". "Devo respeitar os meus colegas" .
No final do ano, as crianças estavam tranquilas e o aprendizado apresentava ótimo resultado, segundo avaliação da Diretoria, que queria me manter na Escola.
Eu estava noiva e ia me casar nas férias. Na semana de encerramento do ano letivo, as colegas organizaram um chá de panelas na própria escola. Foi uma festa linda. Eram tantos presentes... Ganhei aaté um jogo de café de porcelana. Tenho ainda uma xícara desse jogo. Mas o problema era levar tudo aquilo no velho ônibus da TCB. Esperei pelo das 14 horas, que era mais vazio, e com a ajuda de alguns passageiros, consegui chegar feliz em casa.